sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Outono das Trevas Parte II(Contos de Terror)




Outono de 2001 Então, era isso, ela morreu por minha causa, agora entendo. Este era o segredo do meu passado, e que Fortunato Kanon fugia do assunto toda vez que eu perguntava. Agora ficou claro o meu elo com aquela sepultura, a sepultura da minha mãe, que ficava no canto mais distante e recôndito deste enorme cemitério. Eram poucas as vezes que deixávamos o cemitério e saíamos. Em todos os enterros e exumações que ele fazia, eu ficava de longe acompanhando. Numa tarde, eu passeava tranquilamente, entre os túmulos, quando eu ouvi uma voz me chamando bem além do cemitério: - Wallace! Wallace!Wallace! Um frio percorreu a minha espinha, pensei em sair correndo para casa, porém fui até o local de onde vinha a voz, mas não só pelo chamado, e sim por uma estranha força, que não sei explicar como,  atraía-me até lá. Ao aproximar-me da sepultura, avistei uma ninfeta, ajoelhada em cima do túmulo,  ela chorava com as mãos no rosto. Deveria ter entre doze e quatorze anos. Ao chegar à sepultura, a jovem desaparecia. Na lápide, as seguintes inscrições: “Os mais profundos sentimentos à saudosa e carismática Lindsay Wayne. Outono de 1980”. “Lindsay Wayne”, “Wayne” era o mesmo sobrenome que o meu, mas seria coincidência demais. Fortunato me falara que, certa vez, fazendo ronda pelo cemitério, encontrara um bebê abandonado ao lado de uma sepultura com um bilhete na fralda, que dizia: “- Perdoe-me e cuide do meu pequeno Wallace Wayne, por favor.” Era só o que eu sabia do meu passado. Nesta mesma tarde voltei para casa e não comentei nada com Fortunato. Os anos correram rápidos e, quando me tornei adulto, este incidente foi ficando corriqueiro, passando a me perseguir a todo o momento, dia e noite, noite e dia, dormindo ou acordado, - uma perseguição implacável! Sentia-me imbuído dos mais perversos e malignos sentimentos. Era atormentado pelos mais terríveis pesadelos. Não sabia como.  Mas sempre era atraído até aquela sepultura. Certa vez, fui encontrado adormecido em cima do túmulo por Fortunato, que me levou para casa. Neste dia abri o jogo para ele, mesmo porque, no estado de espírito que me encontrava, não tinha mais como esconder os fatos e, - ele desconfiava. Ele me aconselhou a deixar os mortos em paz, pois assim, eu também ficaria em paz, e me deu ordens expressas para nunca mais voltar à tumba de Lindsay Wayne. Mas havia algo de macabro que me envolvia com aquela tumba, algo que me corrompia para o mau, para as trevas! 
Numa noite, ao entrar no quarto para dormir, deparei-me com uma cena assustadora. Estendido na cama,  o corpo carbonizado de uma jovem vestida com uma camisola branca. Súbito, acordara banhado de suor. Minha nossa, tinha sido outro terrível pesadelo! Nesse instante, tomado de puro pavor,  apanhei uma pá, um pé-de-cabra, um lampião e fui até a misteriosa tumba de Lindsay Wayne, desobedecendo às ordens de Fortunato. Cavei a sepultura e retirei o caixão, que pouco trabalho eu tive para arrebentá-lo, já que estava carcomido e apodrecido pelo tempo. Em meio ao esqueleto, encontrei a garrafa, cujo manuscrito, que revelava todo o segredo do meu passado, encontrava-se em seu interior. Fortunado, provavelmente, não teve coragem de destruir o manuscrito logo que encontrou o corpo de minha mãe e resolvera enterrá-lo junto com o corpo e o meu passado. Era isso - pensava eu. A partir desse momento, meu corpo perdeu a alma e deu lugar ao mais puro ódio e sentimento de vingança. A conversão foi para o mau, eu agora só queria vingança e morte! Morte a todos os envolvidos nesta história. Já era noite quando cheguei ao local indicado no manuscrito. Entrei no quintal e fui para os fundos da casa, onde um cachorro latia e mais à frente, vozes que ressonavam vindas de uma janela. O cachorro estranhou minha presença, começou a latir com mais fúria e ameaçava me atacar. De repente, surgiu um grito distante de um dos compartimentos da casa: - Emma! Emma! Emma! - Faça este maldito cão se calar ou eu vou lá fora e arrebento-o inteiro! - Calma, Frankly. O cachorro deve estar com fome, vá da de comer a ele, além de trabalhar para nos sustentar, tenho que fazer todo o trabalho de casa sozinha. - Ora, cale-se! Se aquela pistoleira da Lindsay não tivesse sumido de casa,  ela poderia muito bem ajudar você - gritava o homem. - Pois saiba que, ela foi embora por sua culpa - replicava a mulher. - Já mandei você calar esta maldita boca, senão vou aí e quebro-lhe os dentes! – treplicava o homem. Nesse instante, enquanto os dois discutiam,  o cachorro avançou em mim, mas detive o ataque, prendendo-lhe o focinho com a força de meus poderosos braços. Envolvi a corrente em torno do pescoço do cão apertei-o e o animal começou a grunhir, esbugalhando a língua e os olhos para fora enquanto eu o estrangulava.
.De tanto você gritar, assustou o cachorro e ele acabou se calando - ela continuava. - Pois é isso mesmo, vou tomar banho.
 Deixe-me ir antes que eu acabe com você e este maldito cachorro! – Gritava Frankly.   Emma estendia a roupa, tranquilamente, no outro lado do quintal e nem notou que eu a observava. Voltei rapidamente aos fundos da casa, onde matei o cachorro, apanhei uma sacola que trouxera comigo e pulei a janela que dava acesso à cozinha e ao restante da casa.   Sobre a pia jazia uma enorme faca de cozinha e, embora tivesse força suficiente para matá-los com minhas próprias mãos, peguei a faca assim mesmo.
Passei pela sala e subi, rapidamente, a escada que dava acesso aos dormitórios. Passei pelo banheiro e percebi por uma fresta da porta que Frankly já tomava banho. Entrei no quarto, que deduzi ser deles devido à cama de casal e a mobília.   Preparei bem rápido todo o cenário. Apaguei a luz e deixei apenas o abajur ligado em cima de uma mesinha ao lado da cana e me escondi atrás da porta na penumbra do quarto.   Frankly Looney entrou no quarto, distraído e ficou paralisado com o cenário de terror à sua frente:   - Sobre a cama, jaziam os restos mortais de Lindsay Wayne, ao lado da cama, iluminado pelo abajur e gravado em baixo relevo a lápide com a seguinte inscrição: “Os mais profundos sentimentos a saudosa e carismática Lindsay Wayne. Outono de 1980.”   Antes que ele se recompusesse do susto, desferi-lhe um corte profundo e enorme nas costas. Frankly virou-se para ver quem o atingira, gemendo e assustado! Foi nesse instante que lhe dei um soco que o levou ao chão.   - Quem... Quem... Quem é você? – ele perguntava aturdido.   Vamos, Frankly, seja bonzinho, não tenha medo, você vai gostar, ou prefere que eu o chame de papai! – dizia eu aproximando-me dele. Sentei em cima do peito dele e falei:   - Lindsay Wayne, minha mãe, se matou pouco tempo de me dar à luz, isso foi a vinte e um anos atrás. Ela não suportou a desgraça de ter ficado grávida de você e fugiu de casa.   Os olhos dele emanavam o mais puro terror! Abafei a boca e nariz dele e pedi que ele gritasse.   - Vamos, grite! Grite miserável!  
Frankly esperneou, debateu-se, emitiu sons agonizantes, que por mim eram abafados, até que parou de se mexer, - estava morto.   Instantes depois, Emma subia as escadas gritando.   - Frankly! Frankly! Alguém matou o Manolo!   Ao entrar no quarto, Emma deparou-se com o cenário de horror, que tinha agora como novidade o corpo de Frankly Looney estendido no chão. Ela foi se afastando devagar, de costas e aos gritos. Foi quando eu surgi por trás da porta e lhe tapei a boca.   - Calma senhora Emma não tenha medo - eu sussurrava em seu ouvido.   - A senhora prefere que eu a chame de Emma ou de vovó? A senhora se lembra do dia em que Lindsay falou que aquele bastardo abusava dela? Pois é, eu sou o fruto do crime dele, - eu falava.   - Mamãe me disse que quando ela era criança seu marido adorava brincar com ela, mas isso foi há muito tempo, agora mamãe está morta, - ela ateou fogo no próprio corpo. Joguei a mulher no chão, na sequência, segurei-a com as mãos pelo seu pescoço e apertei, apertei, até que ele deu um estalo, se quebrou e a mulher morreu. Na manhã seguinte, quando cheguei a casa Fortunato Kanon tomava o café, - ele estava inquieto.   - Wallace, onde você passou a noite? Procurei você por toda parte, estava preocupado, a tumba de Lindsay Wayne foi violada - ele falava.   - Wallace, espero que você não tenha nada a ver com isso, - estou pensando em chamar a polícia, - falava o homem.   Eu já sei de tudo, está tudo acabado, eles estão mortos! Você deveria ter me contado tudo, - eu falei, enquanto me aproximava dele, com minha mão direita atrás das costas.   - Eles... Eles quem? Você está louco? Do que está falando? – ele perguntava assustado com minha presença.   Em questão de segundos, segurei os cabelos de sua nuca e passei a faca na garganta dele!
Fortunato caiu no chão debatendo-se e resvalando-se em sangue até morrer. Peguei o corpo e o levei até a sepultura vazia de Lindsay Wayne, que agora teria um novo ocupante.   Joguei o corpo de Fortunato na tumba e o enterrei. Não coloquei rosas e nem identificação alguma no local, ali seria o túmulo de indigente. A partir daquele momento, eu seria o novo coveiro, - o antigo se aposentara e fora embora para sempre sem deixar endereço.   Na tarde do segundo dia do crime, eu estava enterrando um casal da Rua Palmer Baker, que ficava no subúrbio da cidade. Era um mistério que ninguém sabia explicar.   O casal fora brutalmente assassinado, junto com o cão de guarda da casa. No quarto onde os corpos foram encontrados, havia também uma ossada sobre a cama e uma lápide ao lado, gravada com o nome de Lindsay Wayne, sumida há mais de vinte anos.   Exames vão avaliar se a ossada encontrada é mesmo de Lindsay Wayne, porém pouco ajudará nas investigações, afinal ninguém sabia seu paradeiro, se estava mesmo morta ou onde tinha sido enterrada.   Não levaram nenhum pertence ou objeto de valor. Parece que o assassino estava mesmo disposto a só ceifar a vida do casal.  Agora é inverno, o céu está pesado, cinza e nebuloso, o vento gelado castiga os ciprestes e crisântemos, os dias passavam devagar e monótonos.

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